Como a mineração ilegal causou uma crise humanitária na Amazônia
Crianças desnutridas em uma aldeia Yanomami. Sumaúma
A invasão de garimpeiros ilegais em território indígena na Amazônia brasileira destruiu florestas, poluiu rios e trouxe doenças e desnutrição para o povo Yanomami. Agora, o novo governo brasileiro está enfrentando uma crise de saúde e se movendo para expulsar os garimpeiros.
Por Jonathan Watts e Talita Bedinelli • 2 de fevereiro de 2023
Peito magro, barriga inchada, membros como paus - as imagens de crianças e idosos desnutridos que surgiram nas últimas semanas das terras indígenas Yanomami na Amazônia brasileira lembram o pior das fomes na Etiópia, Sudão ou Coréia do Norte. O desastre humanitário nessa região florestal, no entanto, não foi causado por quebra de safra ou guerra, mas por mineração ilegal e negligência genocida do Estado.
Uma investigação de nossa plataforma de notícias Sumaúma, com sede na Amazônia, descobriu que 570 crianças com menos de cinco anos morreram de doenças evitáveis nos últimos quatro anos, um aumento de 29% em relação aos quatro anos anteriores. Uma criança faminta de três anos pesava menos de 3,5 quilos, mais ou menos o tamanho que normalmente seria esperado de um recém-nascido saudável. Outros vomitam vermes. Com pouca comida e sem remédios, a diarréia e a pneumonia tornam-se doenças fatais. A causa principal é uma invasão de garimpeiros ilegais, que trouxeram doenças, violência e degradação ambiental.
"Esta é uma crise humanitária muito grave. A pior da minha vida", nos disse Junior Hekurari Yanomami, chefe do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Ye'kuana. "Todo mundo está doente. Há sérios problemas de alimentação. Os mineiros contaminaram a água. Precisamos que eles saiam."
A crise no maior território indígena do país é agora o primeiro grande teste ao compromisso do novo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em restaurar a resiliência da floresta e de seus guardiões. Após a tentativa de golpe de 9 de janeiro em Brasília por uma multidão de extrema-direita leal ao presidente anterior, Jair Bolsonaro, também é uma chance para o novo governo demonstrar que está no controle e pronto para prestar mais atenção à proteção da Amazônia em vez de do que explorá-lo.
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No cerne da questão está um entendimento antigo entre os ambientalistas de que a melhor maneira de proteger a floresta é proteger seus habitantes tradicionais. Os povos indígenas fazem parte de seus habitats, são especialistas na gestão sustentável dos recursos e estão em melhor posição para se defender contra a invasão das indústrias extrativas. Inúmeros estudos comprovam isso, mas só agora, no novo governo Lula, o Brasil, a nação mais biodiversa da Terra, se compromete a colocar isso em prática, dando mais terra e poder aos povos indígenas e prometendo usar o poder do Estado para protegê-los.
Desde o primeiro dia de sua presidência, Lula disse estar preparado para tomar as medidas necessárias para defender a floresta tropical e seus habitantes. Em seu discurso de posse em 1º de janeiro, ele disse: "Os povos indígenas ... não são obstáculos ao desenvolvimento - eles são os guardiões de nossos rios e florestas e uma parte fundamental de nossa grandeza como nação". Anteriormente, ele havia insinuado ao Congresso que seu governo expandiria as terras indígenas: "Cada terra demarcada é uma nova área de proteção ambiental. Devemos respeito aos povos indígenas. Vamos repelir todas as injustiças contra os povos indígenas."
Essas fotos foram feitas em território Yanomami por indígenas e agentes de saúde nos últimos meses. Sumaúma
Os povos indígenas são essenciais para as metas de Lula de desmatamento zero, fim da expansão da fronteira agrícola e proteção de todos os principais biomas do Brasil, que incluem não apenas a floresta amazônica, mas também o Cerrado, o Pantanal, o Mata Atlântica, Campos dos Pampas e Caatinga semiárida. Esta é uma mudança histórica de direção. Desde que os primeiros invasores europeus chegaram, há mais de 500 anos, o lugar do Brasil na economia global foi definido pela extração de recursos e invasões cada vez mais profundas em biomas e terras indígenas.